Vindo da China, o Budismo chega ao Japão no século VI d.C., dando início a um grande sincretismo religioso com as crenças já existentes. A verdade é que, à semelhança do Xintoísmo e do Bushidô, há uma grande variedade de correntes no Budismo, todas sujeitas a uma ampla gama de interpretações.
De toda forma, a origem do Budismo remontaria historicamente a Siddhartha Gautama, da família real dos Shakyamuni, príncipe que teria vivido cinco séculos antes de Cristo. Após intensa busca espiritual, Gautama teria concluído que a vida é sofrimento e que as causas deste sofrimento seriam o desejo e apego pelas coisas materiais – dilema que continua mais desafiador do que nunca na atual sociedade do consumo.
Após um longo período de jejum e meditação, Gautama teria alcançado níveis elevados de consciência e despertado para a realidade do mundo (Buda quer dizer “desperto” em sânscrito). A partir desta constatação, ele teria indicado os caminhos para a libertação do sofrimento, entre eles o não-apego, a superação do ódio, da luxúria e da ignorância.
Em Mente Zen – Mente de Principiante (Editora Palas Athena), o mestre japonês Shunryu Suzuki (1904-1971) aponta como elementos importantes do Zen Budismo a não dualidade: a separação entre as pessoas e coisas seria mental. O ideal seria a transcendência de todas as distinções e particularidades. Na Ikebana, a unidade entre planta e praticante é apontada pelo atual grão-mestre da escola Ikenobo, Sen’ ei Ikenobo.
O segundo ponto que se pode salientar na relação entre o Budismo e a Ikebana é a noção de impermanência: o tempo é considerado um círculo sem princípio nem fim – está sempre mudando. Na Ikebana, esta noção fica transparente no cuidado que o sensei tem na escolha das plantas que serão empregadas, uma vez que elas representam a estação. Diferentemente de uma arranjo ocidental – vamos supor um belo bouquet de rosas --, o arranjo de Ikebana em geral tem componentes que indicam passado (uma flor bem aberta ou uma folha já velhinha), presente (uma flor em seu auge) e futuro (um botão ou galho ainda novo). Simbolicamente, a Ikebana sugere os ciclos da vida.
Finalmente, um terceiro ponto do Budismo que pode ser associado à Ikebana é a relação de não-eu na execução e na admiração do arranjo. Para o Budismo, a vida individual é apenas um instante da eternidade, uma ve z que se entende que após a passagem para o além a pessoa não terá mais a consciência separada do todo. Assim, quanto menos “eu” houver na composição, mais este espírito do grande Vazio será ressaltado por meio da beleza da própria planta. Neste sentido, a professora Emília Tanaka costuma dizer que o ideal não é fazermos o que quisermos com a planta, mas buscar entender o que ela deseja expressar.
Essas reflexões sobre a influência do Budismo, do Bushidô e do Xintoísmo, claro, não aparecem formalmente explicadas nas aulas de Ikebana. Como em qualquer arte com inspiração zen budistas, prioriza-se sempre a prática em vez da especulação teórica. Seria uma meditação em ação, no conceito do monge vietnimita zen budista Thich Nhât Hanh, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1967. É como se o intelecto humano fosse imperfeito e pequeno demais para dar conta da grandiosidade que é tornar um arranjo feito de plantas uma experiência que transcende a ética, a estética e a técnica.
Texto: Monica Martinez
Imagem: Trinta e Seis Vistas do Monte Fuji, de Katsushika Hokusai (1760-1849)
De toda forma, a origem do Budismo remontaria historicamente a Siddhartha Gautama, da família real dos Shakyamuni, príncipe que teria vivido cinco séculos antes de Cristo. Após intensa busca espiritual, Gautama teria concluído que a vida é sofrimento e que as causas deste sofrimento seriam o desejo e apego pelas coisas materiais – dilema que continua mais desafiador do que nunca na atual sociedade do consumo.
Após um longo período de jejum e meditação, Gautama teria alcançado níveis elevados de consciência e despertado para a realidade do mundo (Buda quer dizer “desperto” em sânscrito). A partir desta constatação, ele teria indicado os caminhos para a libertação do sofrimento, entre eles o não-apego, a superação do ódio, da luxúria e da ignorância.
Em Mente Zen – Mente de Principiante (Editora Palas Athena), o mestre japonês Shunryu Suzuki (1904-1971) aponta como elementos importantes do Zen Budismo a não dualidade: a separação entre as pessoas e coisas seria mental. O ideal seria a transcendência de todas as distinções e particularidades. Na Ikebana, a unidade entre planta e praticante é apontada pelo atual grão-mestre da escola Ikenobo, Sen’ ei Ikenobo.
O segundo ponto que se pode salientar na relação entre o Budismo e a Ikebana é a noção de impermanência: o tempo é considerado um círculo sem princípio nem fim – está sempre mudando. Na Ikebana, esta noção fica transparente no cuidado que o sensei tem na escolha das plantas que serão empregadas, uma vez que elas representam a estação. Diferentemente de uma arranjo ocidental – vamos supor um belo bouquet de rosas --, o arranjo de Ikebana em geral tem componentes que indicam passado (uma flor bem aberta ou uma folha já velhinha), presente (uma flor em seu auge) e futuro (um botão ou galho ainda novo). Simbolicamente, a Ikebana sugere os ciclos da vida.
Finalmente, um terceiro ponto do Budismo que pode ser associado à Ikebana é a relação de não-eu na execução e na admiração do arranjo. Para o Budismo, a vida individual é apenas um instante da eternidade, uma ve z que se entende que após a passagem para o além a pessoa não terá mais a consciência separada do todo. Assim, quanto menos “eu” houver na composição, mais este espírito do grande Vazio será ressaltado por meio da beleza da própria planta. Neste sentido, a professora Emília Tanaka costuma dizer que o ideal não é fazermos o que quisermos com a planta, mas buscar entender o que ela deseja expressar.
Essas reflexões sobre a influência do Budismo, do Bushidô e do Xintoísmo, claro, não aparecem formalmente explicadas nas aulas de Ikebana. Como em qualquer arte com inspiração zen budistas, prioriza-se sempre a prática em vez da especulação teórica. Seria uma meditação em ação, no conceito do monge vietnimita zen budista Thich Nhât Hanh, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1967. É como se o intelecto humano fosse imperfeito e pequeno demais para dar conta da grandiosidade que é tornar um arranjo feito de plantas uma experiência que transcende a ética, a estética e a técnica.
Texto: Monica Martinez
Imagem: Trinta e Seis Vistas do Monte Fuji, de Katsushika Hokusai (1760-1849)
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